Nekasarea: um coletivo basco ao serviço da luta quotidiana para a soberania alimenta
Uma rede de produtores e de consumidores organizados além de uma agricultura apoiada pela comunidade
Jocelyn Parot, décembre 2010
Nekasarea: assim é que se chama a Rede de produtores organizados e de consumidores organizados, que opera em Biscaia, há dois anos. Há 4 anos que o sindicato camponês Ehne, membro fundador da Via Campesina (em 1996), consagra muitos esforços para a implementação de iniciativas de circuitos-curtos alimentares e em parceria, inspirados, entre outras coisas, pela experiência dos AMAP (nome francês da agricultura apoiada pela comunidade-ASC). Em 2010, identifica-se já uma centena de camponeses que organizam sua produção a fim de realizar uma venda direta aos consumidores.
O sindicato Ehne é um peso pesado da paisagem social política local. Iniciado nos anos 1970 em torno da defesa do leite, rapidamente se tornou a expressão da luta camponesa contra o franquismo e para a democratização da sociedade. Há vários anos que ele é o primeiro sindicato dos agricultores da província da Biscaia, com mais de 1000 membros afiliados, ou seja, 60% dos agricultores sindicalizados da região. O sindicato possui uma equipe de uma dezena de assalariados, divididos entre a equipe de comunicação e uma equipe de animação, responsável pela articulação dos sistemas de venda direta em parceria.
Atualmente, existem uns trinta grupos de consumidores engajados nesta démarche, espalhados em toda a Biscaia, mas principalmente em Bilbao e cercanias.
Como as boas receitas de avó, a receita Nekasarea é simples, mas ela exige certa experiência (a rede é apoiada por um sindicato calcado sobre 40 anos de história de lutas camponesas), bons ingredientes, variados e de procedência local, como a loja de alimentos de Zeanuri, paciência, de que são testemunhas os animadores do projeto, durante formações realizadas incansavelmente, semana após semana.
1. Construir uma alternativa para reinserir sentido na troca
Mediante a rede Nekasarea, Ehne quis responder de maneira construtiva aos problemas identificados por propostas de ação, mais do que uma postura unicamente crítica e reivindicativa.
Valores da rede
A rede é construída em torno de valores lembrando claramente o modelo dos ASC e dos AMAP. Assim, a noção de riscos partilhados é central, já que os consumidores pagam de fato por mês, em relação às comandas passadas, mas eles se comprometem para um ano. O preço do cesto, preparado pela rede a partir da produção de vários camponeses, é bastante elevado (até 200 euros por família e por mês para uma cesta completa). As cestas são entregues a cada semana (4 entregas no mês).
O compromisso anual se realiza com quantidades constantes. O que permite evitar os problemas de planejamento. Cada família começa geralmente por um período de experiência de três meses, antes de se comprometer em seguida para o conjunto do ano. O desenvolvimento de Nekasarea desde dois anos, muito importante, revela talvez também uma tradição local ainda muito enraizada: gastrônomos, militantes da alimentação local e sindicalistas camponeses se encontram regularmente nas sociedades de Gastronomia que pululam em cada cidade da região (são quatro somente em Durango). O objetivo principal destas sociedades, velha tradição local, é permitir a troca e o laço social em torno de um jantar preparado a partir de produtos locais. O laço social e a troca: dois termos centrais em todos os encontros que fizemos. Duas noções que guiam a ação dos membros e Ehne, orientados para a informação e a formação, mesmo se, como nos explica Umfaru, a regra de ouro do sindicalismo camponês quer que “mais se comunica, mais inimigos se tem, e mais se é eficaz, mais ameaças se recebe”.
Nekasarea, uma ferramenta pedagógica ao serviço do movimento
Os membros julgaram também necessário acrescentar à experiência da venda direta uma dimensão nova, fazendo da Nekasarea uma ferramenta pedagógica ao serviço do movimento da soberania alimentar.
Com efeito, uma das vantagens de tal sistema de parcerias locais solidárias respaldado por um sindicato, é de assegurar a coerência permanente entre ação local e dimensão global. Graças a um grande trabalho de informação e de formação sobre as evoluções mundiais, assegura-se esta coerência junto aos atores dos ASC: evita-se assim que o novo modelo basco de parceria se torne um tipo de clube de ricos. Ele sai do grupo íntimo, abre-se para a sociedade, faz um esforço para ir além do grupo de iniciados. Constrói sociedade, mais do que comunidade.
O pessoal técnico trabalhando no Ehne é um pessoal engajado, capaz de assegurar um papel de formador como de animador. Assim, Isa não é apenas a animadora da rede Nekasarea, mas ela é também consumidora no seio de uma cooperativa de consumidores em Vittoria. A este título, ela encabeça um projeto de bar-restaurante cooperativo que distribui conforme os critérios da agricultura camponesa local, e que emprega 6 pessoas. Este bar-restaurante visa, entre outras coisas, mostrar que as ações ecológicas não são reservadas para a elite, mas que todos os segmentos da sociedade podem se organizar para montar cadeias produtivas alternativas, menos onerosas socialmente.
2. Os outros atores das cadeias produtivas: o caso da loja de alimentos de Zeanuri
O vilarejo de Zeanuri reserva uma surpresa agradável: o centro deste pequeno burgo encravado nos Pirineus parece muito animado graças à loja de alimentos local. A existência desta loja de alimentos vendendo principalmente produtos locais é um belo exemplo de projeto local repousando sobre uma cooperação múltipla entre as coletividades territoriais, os atores associativos e os produtores locais. O sindicato Ehne não ocupa neste projeto um lugar central, no entanto teve um papel de apoio importante.
A loja de alimentos do vilarejo no cerne de um projeto de revitalização de uma zona rural
Há alguns anos, as autoridades municipais decidiram, diante da inexorabilidade do êxodo rural, lançar um concurso de ideias para revivificar este vilarejo de montanha e seu entorno.
O projeto de loja de alimento-bar-restaurante foi então desenvolvido por uma jovem mulher consciente das problemáticas da agricultura local, já que ela é também produtora, e ela própria proveniente de uma família local de agricultores. Quando seu pai faleceu, toda a fratria decidiu ficar com as vacas da montanha por amor pela profissão mais do que pela rentabilidade.
Ela concebe esta loja de alimentos como um circuito curto e um lugar de vida.
Esta loja de alimentos é um circuito curto: dois pastores oferecem queijo de cabra, uma produtora de hortifrutigranjeiros vende seus produtos orgânicos. A própria proprietária trabalha também na fazenda, e produz principalmente para seu autoconsumo, colocando o excedente em venda.
No início, Irena fazia um pouco de tudo: tomar conta do gado, a gestão quotidiana, a venda e o pão. Ela lançou tudo, em seguida transmitiu suas habilidades e agora, passa o bastão a outros. Oito pessoas se ativam na cozinha e atrás do balcão.
Esta loja de alimentos é também um lugar de muita vida, onde se multiplicam os encontros, onde as pessoas se restauram e se realimentam. Cada dia que passa é ritmado por horários previstos para as diferentes atividades.
O papel de Nekasarea: a coordenação e a defesa da ética
A rede Nekasarea desempenha um papel de coordenação: ela serve para colocar em contato os produtores e a loja de alimentos. Ela permite também comunicar sobre a existência da loja de alimentos junto a seus membros, que são mais sensíveis à noção de consumo local do que a maioria dos habitantes do vilarejo. Estes últimos, nos diz Julia, dirigem-se mais facilmente para os supermercados para se abastecerem mais do que no centro do vilarejo. A loja de alimentos, aliás, é o lugar ideal para discutir as questões de sociedade, em particular as questões de alimentação.
CONCLUSÃO
Nekasarea, é uma nova demonstração da força da mudança social que foi possível graças a uma organização social coerente que permite um desenvolvimento local real, uma preservação do patrimônio agrícola e cultural, e realização do projeto coletivo de « viver melhor juntos ».
Sources :
Bulletin International de Développement Local Durable n°74